Porquê?

Corremos porque não temos asas para voar...

A anatomia de um treino...

Após hesitação iniciei por aqui acima...
Depois de quase uma semana a combater uma gastroenterite, as melhoras acentuadas dos dois últimos dias, deram-me coragem para retomar os treinos.

Dirigi-me à serra, a minha zona de eleição e o meu "centro de treino" permanente. A temperatura é o costume, 29º, o que significa que na serra será algo acima disto.

Na última vez que aqui estive tinha hesitado em tomar um trilho, que embora mais curto, sobe quase na "vertical" até ao topo. Agora, depois de pensar nisto, voltei uns metros atrás e enveredei  por ele. Sabia que, após a semana desgraçada que passara, estaria algo debilitado. Só não estava preparado para os sintomas que me acometeram. Logo nas primeiras passadas a subir, forte dores musculares deixaram-me perplexo. Pensei que teria de desistir do treino. Com grandes dificuldades resolvi insistir um pouco mais, o percurso era um trilho por entre pinheiros e eucaliptos de grandes dimensões e era marginado por carrasca, giestas e fetos. Contra ele tinha o facto de, em alguns locais, ser pior que subir escadas íngremes. Depois foi a surpresa. Acho que nunca conseguirei compreender estes "eventos" de carácter físico, as pernas deixaram de doer e começaram a responder de forma óptima.


...o trilho por vezes era mesmo agressivo.
Assim cerca de dois km depois entrei de rompante no átrio da igreja lá no alto. Encharcado que nem um pinto e ofegante, surpreendi os jovens casais de namorados que procuravam o seu momento de privacidade naquele local. Ficaram a olhar para mim com cara de quem estava a pensar: "De onde é que surgiu este figurante?" De facto a entrada no átrio faz-se por uma subida bastante íngreme que não permite ver a aproximação de ninguém. Fosse como fosse, não estorvaria mais, um pequeno gole de água e deixei-os novamente no mundo deles.

Após esta subida quase entrei de rompante no átrio da igreja
Saído do átrio, entrei novamente no trilho que me levou primeiro á antena e pouco depois  torre de vigia. Daqui conseguia ver o horizonte carregado de uma enorme nuvem de fumo, felizmente aqui a atmosfera estava límpida e conseguia respirar perfeitamente. Inquiri o vigia sobre a possibilidade de incêndios na zona para onde pretendia dirigir-me. "Tudo tranquilo." responderam-me. O fumo que se avistava no horizonte era de um enorme incêndio na região de Amarante, bastante longe deste local.

Reflectindo sobre a enorme devastação da floresta neste país, segui por uma zona que é bastante habitual nos meus treinos, também ela queimada recentemente, as plantações de eucaliptos estavam omnipresentes. Embora lamente o recurso exclusivo a esta espécie para reflorestação, não pude deixar de reconhecer que está melhor assim do que desértica com a vi há pouco tempo atrás. Não conheço mais nenhuma árvore com a capacidade de crescimento do eucalipto. Pequenas árvores já pintam de verde a totalidade das encostas e delineiam a margem do caminho por onde sigo. Dei por mim a cheirar as folhas... tão refrescante este cheirinho.

Agora entrei novamente numa zona bem arborizada e a sombra foi uma autêntica benesse. Reparei na característica terra amarela do chão com muito pouca pedra, aqui corre-se mesmo bastante bem. Uma brisa percorria a paisagem e passava por mim de uma forma muito agradável. Estou habituado a passar aqui em perseguição do meu "lobinho novo" mas ultimamente ele tem andado "tresmalhado".

Pouco depois passava pelo desvio que levava ao "elevador", subida ex libris desta serra e que todos os que aqui treinam conhecem bem, prudentemente, continuei em frente e na bifurcação que se desenhava agora à minha frente, optei pela que subia e que me levaria à outra vertente da serra.
O inicio foi bom, sempre à sombra, mas cedo a exposição solar trouxe aquele acréscimo de dificuldade  que o calor implica. 

aqui, optei pela da direita que me levaria à vertente
contrária da serra...

Percorridas umas centenas de metros parei e olhei para aldeia lá no fundo. Havia música e uma animação inaudita num local que estou habituado a conhecer pelo silêncio. Observei o que tinha subido até aqui, era preciso percorrer pelo menos quatro ou cinco vezes mais para atingir o cimo da elevação. Com a paciência de um resignado meti os pés ao caminho. Tinha de continuar ou nunca mais sairia daqui.

Parei e olhei pata trás. Era preciso continuar a subir ainda muito mais...
Sempre a subir umas vezes mais, outras menos, outras ainda bastante mais e com o sol sempre a malhar. Vieram-me há memória os momentos em que aqui passara, havia relativamente pouco tempo, com o Miguel, com essas recordações fui prosseguindo até atingir o ponto mas elevado. Parei um pouco para admirar a paisagem, os pequenos eucaliptos preenchiam grande parte das encostas que era possível avistar deste ponto, o que, só por si, era revelador da enorme área que tinha ardido num passado recente. 

Já na vertente contrária da serra, a subida em direcção ao
ponto mais elevado fazia-se agora sob o sol quente
Mais um pouco de água e iniciei a descida que me conduziria a um pequeno aglomerado de casas onde daria uma volta apertada e continuaria a descer até atingir o nível do rio, deixando definitivamente para trás os trilhos altos e demasiado solarengos da serra. Durante a última paragem lá em cima, tinha visto um bando de aves a voar no fundo do vale. Inicialmente pareciam-me perdizes mas depois pensei que pudessem ser pombos dada a proximidade das casas, afinal eram mesmo perdizes. Quando estava preste a atingir o ponto mais baixo do meu treino, pousaram junto ao rio tendo ficado três na estrada que eu percorria e mesmo á minha frente. Engraçado...
A paisagem verde vivo e a agua murmurante do rio pareciam-me parte do paraíso se comparadas com poeirenta e semi-desértica zona alta da serra. 

Esta parte junto ao rio, por comparação com a serra,
parecia parte do paraíso
Mais um esforço e cheguei a Couce. Agora o motivo da música e agitação que eu observara lá do alto, era bem visível. Couce estava em festa. Aproveitei para registar o momento, havia pequenas tasquinhas de ocasião que ofereciam bebidas frescas e enchidos de varias especialidades que exalavam um aroma tremendo. Afastei-me de forma bastante relutante, um lanchinho vinha mesmo a calhar. 

afinal o motivo musica que ouvira lá em cima era o facto
de Couce se encontrar em festa.
Antes de abandonar a aldeia vi uma pequena eira transformada num palco improvisado onde iria, pelo que deduzi, actuar um teatro itinerante, tinham uma pequena carroça muito gira e quis tirar uma foto, foi então que uma actriz se apercebeu e fez pose para a fotografia, acho que fez justiça à sua vocação para a profissão.

...foi então que uma actriz se apercebeu e fez pose para a fotografia,
acho que fez justiça à sua vocação para a profissão.
Agora poderia optar pelo trilho ou pela estrada para me dirigir a Valongo. Às vezes vou pela estrada para manter um ritmo mais homogéneo, mas hoje vou pelo trilho. Com a festa aqui, deve haver muito trânsito na estrada que é bastante estreita.

Doze quilómetros depois de ter iniciado o treino avistava a minha meta, exactamente o ponto onde tudo começara.

Este foi, dadas as circunstâncias, um treino bastante honesto. Se calhar até demasiado honesto.
Vamos ver o que dizem as pernas quando arrefecerem um pouco.

Em jeito de balanço, foi um tempo muito agradável, que incluiu a redescoberta de um trilho que há muito não fazia e muitas recordações de outras corridas por estas bandas. Nesta altura do campeonato só peço que não me apareça mais nada para levar o planeado à prática. 

Hoje fui eu e o trilho. A luta continua.











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