Porquê?

Corremos porque não temos asas para voar...

A minha história da 13ª Maratona do Porto é uma história de fé, cumplicidade e superação.

Á espera da partida.
Depois de na anterior edição ter desistido, tinha muita vontade de fazer esta prova. Ainda inebriado pelas emoções recentes da Serra dArga, fiz a inscrição para a Maratona do Porto. Mas a vida não é perfeita, e depois de uma semana de descanso, quis a má sorte que o primeiro treino de preparação produzisse uma lesão no pé esquerdo, uma metatarsalgia extremamente dolorosa. Não consegui mais treinos nem sequer curar a lesão que por acaso está bem latente enquanto escrevo estas linhas.
Foram quatro semanas de grandes dúvidas sobre o que fazer, sempre com esta problemática na cabeça, posso dizer que me levantava a pensar nisto e me deitava nas mesmas condições. Voltaren comprimidos e Voltaren Gel até perceber que não adiantavam nada, mas quando parei o tratamento a dor avivou bastante pelo que alguma coisa estariam a fazer. Continuei sem fazer mais nada na esperança de que o organismo reparasse por si este problema e se assim não fosse, voltaria ao Voltaren dois dias antes da prova.

Véspera da prova, as coisas não mudaram muito e o regresso ao Voltaren estava garantido, para já o gel e no dia da prova um comprimido antes da partida. A história começava a escrever-se. Primeiro com um acto de fé, e antes de sair de casa, num breve pedido a Deus, solicitava que ele me desse forças e me acompanhasse naquela dificuldade eminente. Não sou grande católico, mas quando as coisas estão mais difíceis...


Zona de partida com praia de Matosinhos em fundo



Miguel, sempre disponível no apoio.
Chegara o momento da cumplicidade. Desta vez estava sózinho nesta aventura, o Miguel não fez a inscrição, pelo que estava entregue a mim próprio. Estava enganado, no dia da partida levantou-se cedo e foi tomar um cafézinho comigo acompanhando-me até ao tiro de partida, mas fez mais, deslocando-se de bicicleta, ainda esteve em dois pontos para me incentivar, primeiro em Matosinhos no km 7,5 e depois, imagine-se, no km 20 junto á ponte D. Luís onde seria impossível continuar. A importância destes dois momentos foi indescritível. Para quem seguia em dificuldades como era o meu caso, este apoio era mesmo revitalizante.


Fase da corrida com a Ponte da Arrábida ao fundo



Travessia da Ribeira do Porto
Do km 20 ao 25 melhorei um pouco fisicamente sem saber bem o porquê. Apenas o pé, que apesar das sapatilhas confortáveis, da palmilha com que as tinha reforçado e ainda do Voltaren, não dava sinais de me querer deixar em paz. Ainda assim, não sentia que estivesse a piorar o que já não era mau. No entanto a partir do km 28 a fraqueza voltou a atacar, as pernas pareciam não conseguir dar mais um passo. As preces multiplicavam-se em desespero. A falta de preparação atingia agora o auge das suas consequências. Enfiei na cabeça que tinha de aguentar até ao km 30, passou a ser minha meta psicológica, sentia que se conseguisse ver a placa com o número 30 conseguiria também fazer o resto.

Nesta fase a travessia da Ribeira de Gaia e da Ponte D. Luís, zonas com bastante apoio popular deram um empurrão, o meu passo de corrida era irregular com algumas mudanças de direcção intempestivas, pelo que não pude seguir pelo passeio liso como os outros, já que poderia tropeçar,  e optei pela estrada de paralelo horrível naquela zona. Pelo menos tinha a estrada toda para mim.

Finalmente a placa do Km 30, quando a vi a reacção foi: “estás aí filha da ... “ até me ri sózinho, não sei bem se da piada se de alívio por atingir aquela marca, é que também marcava a inversão de marcha e finalmente começar a correr em direcção á meta. Até aqui fora sempre correr a fugir dela e isso, psicologicamente também afecta.

Abri o cinto onde levava um gel e consumi-o. Tenho uma dificuldade enorme em ingerir estas pastas, mas aqui não tinha mesmo outra solução. Precisava de alguma energia extra para estes quilómetros finais. Fui deixando passar o alcatrão debaixo dos pés, o ritmo cardíaco estava tranquilo, respiração idem aspas e apenas as pernas sentiam grandes dificuldades. O pé era mais do mesmo e nesta altura já me tinha habituado, também a concentração para obrigar as penas a continuar o trote era tal que se sobrepunha a todas as outras sensações.

15 países, incluindo Portugal presentes nesta edição


Assim cheguei ao Km 41 e último abastecimento. Agarrei numa das esponjas disponíveis e apertei-a sobre a cabeça, a água gelada até me sufocou por um momento, mas ajudou a retirar o torpor do cansaço. Bebi um gole da garrafa e deitei-a fora. Quando passei o arco que marcava um quilómetro para meta ergui a cara para o aquele bonito céu azul e... obrigado meu Deus. Senti que precisava de agradecer aquela força extra que não tinha mas que sempre foi aparecendo nos momentos decisivos.

De repente ouvi aquela voz inconfundível “Vamos embora moço...”. Incrivelmente o Miguel estava nas barreiras á minha espera e batia palmas de incentivo. Depois de tanto que tinha passado, aquilo foi de mais e enquanto fazia a última curva entre os aplausos das pessoas que enchiam aquelas barreiras e ao passar pelo Miguel, cerrei punhos e gritei o que pude extravasando a alegria, o sofrimento e todas as emoções destes 42 km.

Pouco depois perguntei ao Miguel: E se eu tivesse desistido, ias estar ali toda a tarde?
Respondeu-me naquele estilo convicto dele: “Mas eu nunca duvidei!” Pois bem, deve ser o meu único apoiante, mas é de peso...

Para mais tarde recordar a minha presença nesta edição

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