Trecho do Ultra Douro e Paiva 2014 |
Diariamente somos
confrontados com falta de tempo para isto, para aquilo, temos noção
de que não podemos perder tempo e corremos atrás das tarefas, dos
compromissos. Esta aceleração do tempo não nos permite uma experiência
de tipo algum, pois tudo é demasiado rápido, demasiado breve. O
fluxo de acções que temos de desenvolver só nos permite analisar
qual a próxima que pretendemos executar. Trancados nesta espécie de
bolha temporal vemos passar os dias, os meses, e quando damos por
ela, até os anos. O tempo assim decorre sem uma estrutura ordenada e
não se guia por quaisquer coordenadas que engendrem uma duração.
Fazemos uma espécie de apologia daquilo que é passageiro e efémero.
Um dos factores
muito importantes da corrida, para mim, é que me proporciona os
raros momentos em que consigo desacelerar o tempo. Aí, imerso no
esforço, liberto das grilhetas de urgência do quotidiano, sinto o tempo abrandar. Consigo perceber os estímulos exteriores que me
rodeiam, o cheiro a resina do pinhal, a fuga veloz do lagarto por
cima das pedras quentes, o serpentear da agua por entre os seixos,
oiço a minha respiração ofegante como se estivesse em som de fundo
e surgem as reflexões e os pensamentos. E o pensar, no seu sentido
profundo, não se deixa acelerar facilmente.
A este estado
contemplativo que a corrida me proporciona, chamo de aroma do
tempo...
...e cheira tão bem
este tempo mais vagaroso que nos permite viver tão mais plenamente.
Nesta era de
atentados, de assassinatos e de suicídios, seria bom que a
Humanidade também abrandasse o tempo, contemplasse o caminho que
está a trilhar e refletisse.
Faz todo o sentido
este parágrafo de Friedrich Nietzsche:
“À falta de
sossego, a nossa civilização desemboca numa nova barbárie. Em
nenhuma época foram mais cotados os activos – quer dizer, os
desassossegados. Entre as correcções necessárias que devem
introduzir-se no carácter da Humanidade, conta-se, portanto, uma
ampla medida de fortalecimento do elemento contemplativo”
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