Porquê?

Corremos porque não temos asas para voar...

Um pastor alemão como improvável companheiro de "infortúnio" :-)


Aconteceu a semana passada.
Naquele fim de tarde os 33 graus de temperatura destilavam no ar os aromas de pinho e eucalipto. Apesar do calor, eu precisava mesmo deste treino. Foi uma autentica fuga para a frente, escapando aos níveis de stress desse dia que roçaram o impensável.

Tinha deixado Valongo para trás e percorria agora
um estreito carreiro lateral ao rio Ferreira...
A cada passada, deixava para trás as más sensações e, paulatinamente, ia restaurando o equilíbrio.

Tinha saído de Valongo, percorria agora um estreito carreiro lateral ao rio Ferreira e, embora me encontrasse na metade do vale abrangida pela sombra, o ar abafado que se fazia sentir depressa me deixou a pingar.

Nos primeiros cinco quilómetros, consumi quase toda a capacidade da garrafa de água que transportava comigo. Agora, teria que gerir bem o restante nos oito quilómetros que estavam por fazer. Fora apanhado de surpresa pelo golpe de calor e todo eu escorria suor .

Quando cheguei a Couce, parei debaixo de um enorme carvalho e olhei para a garrafa. Não restariam mais de 0.25 litros. Os calções  e a camisola eram demonstrativos da quantidade de líquidos que eu estava a perder. Não podia continuar a beber á maluca. Na aldeia, dos três ou quatro residentes não se via ninguém, nem sequer os cães que costumam fazer sentinela na rua. "Não os censuro, com este calor..." - pensei.

Na aldeia, ninguém.
Nem esta comissão de recepção que tão bem conheço... 😋
Cerca de dois quilómetros à frente, surgiu a subida que me conduziria até ao local onde costumo fazer a inversão do percurso. Ansioso por chegar a esse ponto lá no alto, incrementei um pouco a velocidade de corrida. Com o ritmo cardíaco no máximo, sabia que iria ter de fazer uma pausa quando lá chegasse. Depois, iniciaria a descida para enfrentar outra vez a dureza das variações bruscas de inclinação que o terreno impõe.

Ofegante, olhei de soslaio para a garrafa, mas não cedi à vontade de beber  já aquele restinho. Ainda havia muita terra e muito calor pela frente.

Uma última olhadela para a paisagem e arranquei...
Uma última olhadela para a paisagem e arranquei, antes que o corpo começasse a apreciar demasiado aquele descanso. Foi então que vi no meu encalço um ciclista e um cão a correr ao seu lado. Comecei por ver se era capaz de me manter inalcançável, mas depois de um quilómetro já me estavam nos calcanhares. O estradão de terra que percorríamos deixava escapar um pó fininho que parecia aumentar a sensação de sede. 

Passaram por mim. A partir daí, a ideia era não perder muito terreno para eles. A inclinação a subir era ligeira mas extensa e o esforço para os acompanhar combinado com aquele calor, estava a minar-me as forças. Mesmo assim não desisti, o correr indisciplinado do cão, pouco preocupado com os incentivos do dono e a passar um mau bocado com calor, atrasavam um pouco o conjunto e eu, com um esforço extra, conseguiria manter apenas uns metros  entre nós. O estradão de terra batida acabava perto da aldeia de Couce e a minha meta era manter-me perto do ciclista e do seu quadrúpede companheiro até lá.

Olhei para o relógio, o ritmo andava abaixo de cinco minutos por quilómetro. Com esta temperatura e tendência de subida não aguentaria muito mais. Abrandei um pouco, agora faltavam uns trezentos metros até ao local que eu tinha imaginado perseguir esta dupla. Entretanto, o cão ficara um pouco para trás, fazendo tábua rasa dos assobios do dono que o chamava insistentemente. Parecia, (o ciclista) não perceber que o dia não estava para aquelas correrias, já que tanto eu como o cão estávamos bem conscientes disso.

Finalmente parou a bicicleta. Mesmo no local que eu pretendia, depois cheguei eu e por último o cão. Era um pastor alemão com uma enorme pelagem e não resistira a fazer duas viagens ao rio para se arrefecer, algo que me pôs a pensar sobre qual de nós os dois era o mais sábio...

Era um pastor alemão com uma enorme pelagem e não
resistira a fazer duas viagens ao rio para se arrefecer
Ele, pouco preocupado por ter sido o último a chegar, surgiu completamente embebido em água e substancialmente mais fresco que os dois bípedes que acompanhava. Quando se preparava para sacudir toda aquela água aproveitei para arrancar novamente. Ainda senti uma chuva miudinha proveniente daquela máquina de torcer em que, repentinamente,  ele se transformou.

Durante aquela pequena pausa tinha bebido toda a água que me restava. Faltavam agora três quilómetros e meio difíceis até ao carro, mas estava tudo controlado. Tinha ingerido bastante água ao longo do dia e com a garrafa de 0,75 litros que tinha consumido estava ainda bem hidratado, apesar dos  líquidos que tinha perdido. De todo o modo, o ritmo do ciclista e do seu cão tinham sido um pouco demasiado para mim. Estava na altura de adoptar um ritmo mais repousado, bastante mais "repouuusaaaadoooo"...😅

Sentia-me incomparavelmente mais relaxado do que quando chegara. Esta terapia nunca falha. 

Uma pequena dor na rótula esquerda apresentava-se como a factura a pagar. Indiciava uma inflamação que viria a interferir nos treinos futuros, mas pouco. A luta continua...

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